I Introdução
Multipropriedade é o regime de condomínio em que cada um dos proprietários de um mesmo imóvel é titular de uma fração de tempo, à qual corresponde a faculdade de uso e gozo, com exclusividade, da totalidade do imóvel, a ser exercida pelos proprietários de forma alternada. A multipropriedade teve sua primeira previsão legal em 20 de dezembro de 2018 com a promulgação da Lei 13.777 de 2018. Antes disto adotava-se a legislação civil no fonte primária.
Dessa forma, é importante compreender que há aplicação subsidiária de todas as regras de condomínio, tanto aquelas que constam do Código Civil quanto as que estão em legislações esparsas.
A multipropriedade se institui por registro no cartório de registro de imóveis. Lá deve constar a duração dos períodos de cada fração.
Quando o imóvel se destinar ao regime da multipropriedade, além da matrícula do imóvel, haverá uma matrícula para cada fração de tempo, na qual se registrarão e averbarão os atos referentes à respectiva fração de tempo. Penhoras não poderão recair sobre a unidade como um todo.
O condomínio edilício pode adotar a multipropriedade em parte ou na totalidade de suas unidades autônomas (hipótese afrente aventada), desde que conste previsão no instrumento de instituição. Ou, se posterior à instituição, com deliberação e aprovação da maioria absoluta dos condôminos.
Cada fração de multipropriedade precisa, obrigatoriamente, contar com sete dias (seguidos ou intercalados). O imóvel em regime de multipropriedade terá, portanto, no máximo, 52 unidades (pois em um ano existem cinquenta e duas semanas).
Estes dias poderão se dar sempre na mesma data ou flutuar conforme procedimento que respeite a isonomia dos multiproprietários. Este procedimento deve ser PREVIAMENTE divulgado.
É lícito que haja pactuação de períodos distintos. Um multiproprietário, pois, pode contar com quatorze dias pela sua quota e outro por sete.
II Condomínio
A votação do multiproprietário nas pactuações condominiais somente se dá quando este esteja quite com as obrigações condominiais. Seu voto dá-se correspondente à quota de sua fração de tempo no imóvel.
Importante, entretanto, ter em vista que há dois tipos de deliberações, aquelas para o condomínio edilício e aquelas para multipropriedade.
Sendo assim, se determinada unidade autônoma em um condomínio edilício composto por cem unidades resolvei instituir multipropriedade entre dez pessoas, teremos os seguintes cenários.
No âmbito da unidade autônoma (1 unidade) cada cota corresponderá a 10% do quórum total.
No âmbito do condomínio edilício (de 100 unidades), cada cota deste apartamento com dez proprietários corresponderá a 0,01% do quórum total, uma vez que cada unidade como um todo corresponde a 1%.
Distingue-se, pois, a contribuição da multipropriedade (entre os dez proprietários do mesmo apartamento) e a contribuição do condomínio (entre as 100 unidades).
É impossível ao multiproprietário exonerar-se do uso/gozo da área comum fins de exonerar-se do pagamento da contribuição condominial.
Não será lícito ao condomínio prever a impossibilidade do uso do multiproprietário inadimplente à área comum em função da inadimplência.
Na hipótese de o imóvel objeto da multipropriedade ser parte integrante de empreendimento em que haja sistema de locação das frações de tempo no qual os titulares possam ou sejam obrigados a locar suas frações de tempo exclusivamente por meio de uma administração única, repartindo entre si as receitas das locações independentemente da efetiva ocupação de cada unidade autônoma, poderá a convenção do condomínio edilício regrar que em caso de inadimplência o inadimplente fique proibido de utilizar o imóvel (área privativa).
O multiproprietário que incorre em inadimplemento das despesas ordinárias ou extraordinárias poderá ter sua unidade adjudicada pelo condomínio.
Caso o condomínio em multipropriedade tenha existência no âmbito de condomínio edilício, o art. 1.358-R do CC faz exigência expressa de que haja, necessariamente, um administrador profissional (com inscrição no Conselho Regional de Administração), que cuidará de todas as disposições internas e administrativas referentes às unidades em multipropriedade, tendo o poder, inclusive, de fazer pequenas alterações regimentais.
III Alienação
Não haverá direito de preferência na alienação de fração de tempo, salvo se estabelecido no instrumento de instituição ou na convenção do condomínio em multipropriedade em favor dos demais multiproprietários ou do instituidor do condomínio em multipropriedade.
O adquirente será solidariamente responsável com o alienante pelas obrigações de pagamento de cota condominial caso não obtenha a declaração de inexistência de débitos referente à fração de tempo no momento de sua aquisição.
IV Matrículas e Inscrições municipais
Cada fração de tempo possuirá uma matrícula individualizada. BLASKESI (2019, p. 41) [1]: “uma vez registrado na matrícula-mãe, abrem-se matrículas individuais para cada fração de tempo desse novo direito real, onde consta, de forma específica, quando e como pode ser usado”. O município poderá realizar a inscrição individualizada de cada unidade junto ao cadastro municipal para fins de cobrança de IPTU e ITR.
O multiproprietário, pois, só pode pagar IPTU referente à sua unidade periódica, afastando-se responsabilidade – solidária ou não – por ausência de previsão legal.
[1] BLASKESI, Eliane. Multipropriedade ou Time-Sharing: Primeiras Impressões. Revista SÍNTESE Direito Imobiliário, ano IX, n.º 49, Jan-Fev de 2019, pp. 30-42.